quarta-feira, 24 de maio de 2017

Sobre o desenvolvimento chinês





José Luís Fiori

Engana-se quem pensa que a China nunca foi um estado expansionista. O poder é sempre expansivo, ainda que ele possa ter longos períodos de “adormecimento” ou “fragmentação”. Foi assim, em qualquer tempo ou lugar, durante toda a história da humanidade, independente da existência de economias de mercado, e muito antes da existência do capitalismo. E o mesmo aconteceu na história da China. Começando pelo próprio processo originário de unificação do império chinês depois de longos séculos de guerras e conquistas, durante o período dos “Reinos Combatentes”, entre os anos de 481 a.C e 221 a.C.. Resumindo a história, o primeiro império chinês nasceu da expansão vitoriosa de dois reinos situados no nordeste da China atual: o Estado Qin, que foi o grande vencedor da guerra e promoveu a unificação, e o Estado Han, que o sucedeu em 206 a.C e foi responsável pela construção de um império que durou 400 anos, período “dourado” da história chinesa. O Império Han depois estendeu sua influência à Coréia, Mongólia, Vietnã e Ásia Central, chegou ao Mar Cáspio e inaugurou a famosa “rota da seda”. Foi neste período que o império chinês concebeu o seu “sistema hierárquico-tributário” de relacionamento com povos vizinhos que aceitassem manter sua autonomia em troca do reconhecimento da superioridade da civilização chinesa. Um “modelo de relacionamento” que se transformou numa “rotina milenar”, dentro do mundo sinocêntrico, até meados do século XIX.

No século XIV, depois de um longo período de fragmentação territorial e guerras intestinas, a China viveu um novo processo de centralização do poder, sob a Dinastia Ming (1368-1644), que reorganizou o estado chinês e liderou uma segunda “era de ouro” nas artes, na economia, na filosofia, mas também nas conquistas territoriais e navais. De novo, a centralização do poder interno se prolongou no expansionismo externo, através da diplomacia, da guerra e do brilho exemplar da civilização confuciana. Durante a Dinastia Ming, a China reconquistou a Mongólia, a Coréia e o Vietnã, e impôs seu domínio ao Japão, Java, Brunei, Srivijaya, Sião e Camboja. Em 1424, o império suspendeu as expedições marítimas do Almirante Cheng Ho, mas foi apenas uma opção pelas conquistas terrestres, através das infinitas “fronteiras móveis” do império, por onde se multiplicou o seu território e a sua população, sem que ele tivesse que se afastar de suas linhas de suprimento estratégico, como ocorreu com os impérios marítimos europeus. 


No tempo em que a acumulação do poder se media em território, população, excedente econômico e capacidade de tributação, a China conquistou, em três séculos, mais do que o dobro do que foi conquistado pela Europa e seus impérios marítimos.

 E o mesmo veio a ocorrer mais tarde, com a Dinastia Qing, que governou a China entre 1668 e 1912, em particular durante o reinado do Imperador Ch´ien-Lung (1735-1799), quando a China duplicou seu território, conquistando o Tibet, Taiwan, e todo o oeste do atual território chinês, até o Turquistão. No caso dessas regiões, a conquista chinesa foi particularmente violenta e as terras conquistadas foram transformadas em colônias, numa posição inferior dentro do sistema de “círculos concêntricos”, como era concebido pelos chineses o seu “Império do Meio”, construído a partir do seu pináculo civilizatório, situado em Pequim.

Depois das duas “Guerras do Ópio”, em 1839-42 e 1856-60, a China foi submetida a um século de humilhações por parte das potências europeias [...]. Mas na segunda metade do século XX, a China voltou a centralizar seu poder interno, expulsou as potências coloniais, adotou o capitalismo como instrumento de acumulação de poder e entrou num novo período de crescimento econômico e expansão externa do seu poder e de sua influência civilizatória. E está reconstruindo o seu antigo “sistema hierárquico tributário”, dentro e fora do antigo mundo sinocêntrico [...]


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